Sabemos que "é a lei da vida", como tantas vezes nos disse a avó Miquinhas.
Sabemos que o ciclo normal das coisas será sempre o dos avós acompanhar o nosso nascimento e crescimento e nós, infelizmente, assistirmos à morte física deles.
Sim, digo física, porque por mais cliché que pareça, dentro de nós há sempre algo que nos diz que eles ainda estão vivos.
Os meus avós estão vivos quando os netos se juntam, se unem e partilham bons momentos.
Estão vivos num olhar, na ternura, na paciência, na mão na anca.
Estão vivos nos filhos e nos netos.
As boas memórias que guardamos, os ensinamentos que nos transmitiram, nunca permitirão que os nossos avós morram de verdade.
Sei que são invisíveis porque não os vejo, mas sei que estão aqui, porque os sinto.
Sinto hoje, senti ontem e sentirei sempre.
No olhar dos meus tios, no sorriso dos meus primos, no empurrão quando as coisas correm mal, na sensação de toque no joelho que aconchega quando tudo parece desmoronar, num momento de partilha e gargalhadas com as primas, na lembrança do sorriso que faz esquecer tudo o resto e perceber como és afortunada pela família em que nasceste.
Porque o amor eterno existe e irá sempre além dessa tolice que é a morte.
Ser gaja dá uma trabalheira desgraçada, não me lixem, dá mesmo.
Temos um humor que varia mais do que a afinação da Maria Leal. No mesmo dia acordamos bem dispostas, estamos no trânsito e o condutor da frente não dá o pisca ficamos irritadas, chegamos ao escritório com tudo para ontem e ficamos desesperadas, passa aquela música e ficamos tristes, do nada já estamos super felizes, sem esquecer da ansiedade, da melancolia ou da nostalgia que também nos visita constantemente.
Se para alguns a TPM é um mito, as gajas sabem que é verdade e que é realmente aborrecida.
Depois temos aqueles dias ou quem sabe semanas não, em que tudo aborrece, em que tudo fica mal, em que o cabelo está com o corte horrível, em que a borbulha não desaparece, em que não temos nada para vestir e quando tentamos ir às compras não encontramos o que quer que seja do nosso agrado.
Sim, bem sei que parece fútil e que devíamos estar constantemente a pensar em mudar o mundo, no feminismo, ou em combater a fome mundial, mas não estamos, ninguém está.
Além disso temos de fazer a depilação, algo tão mas tão agradável. Há lá coisa mais bonita e agradável do que levar com cera quente naquelas zonas sensíveis?! De repente não me recordo de nada.
Temos de passar pelo ginecologista, sentar naquela cadeira com uma pernita para cada lado e levar com um estranho a mexer no nosso peepz. Não é bom?!
Nem vale a pena falar daquela semana do mês em que os tampões são os nossos melhores amigos, pois não?!
Então depois temos de ter as unhas cuidadas, que é o mesmo que dizer que o verniz não deve estar lascado, dá mau ar. Agora que olha para as minhas, upss.
No trabalho temos de andar a correr de um lado para o outro em cima de uns saltos altos. É que se pelo ar de miúda já se torna difícil levarem-me a sério, sem saltos é lindo de ver, as expressões "oh filhinha" e "oh menina" são constantes.
Nos últimos dias as notícias que nos chegam são absurdas, completamente absurdas, terríveis, parvas, estúpidas, não sei como as definir, só que há coisas que eu não entendo.
Viram a reportagem da jornalista Ana Leal, sim é da TVI e qual é o problema?
Viram o negócio sinistro da adopção ou famílias de acolhimento no Reino Unido?
Tudo serve para fazer dinheiro, mas crianças? Seres indefesos que não sabem e nem sequer escolheram nascer?
Não, isso é demasiado monstruoso.
Também sei que só temos uma parte da história e que teremos sempre de ouvir as duas versões, mas o que dizer sobre o discurso do Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, Dr. José Luís Carneiro?!
Como é que os Portugueses espalhados pelo mundo, neste caso no Reino Unido, não têm acesso a apoio jurídico gratuito ou a apoio que pelo menos não lhes leve couro e cabelo?!
Como é que um Estado e um Consulado permite que isto aconteça? Bem sei, somos pequeninos, mas teremos sempre de ser lixados e permitir que tal aconteça?!
Cá tivemos um caso de um casal inglês que foi jantar fora e deixou os filhos a dormir na casa de férias, o que lhes aconteceu? Nada.
Lá temos o caso de um casal que não abriu a porta a uma assistente social/equipa médica e o que lhes acontece? Ficam sem o filho.
Sim, agora já conseguimos apurar mais dados sobre os casos, e repito há sempre duas versões em cada história, mas não dá para ficar quieto, para ficar impávido e sereno perante estas atrocidades.
Percebes que estás enferrujada, percebes que tens músculos que desconhecias por completo e também percebes que a luta maior não é com as pernas mas com a cabeça.
Luta contra a vontade de desistir, que é sempre a mais fácil.
Mas não o fazes, continuas, mesmo com dores porque "é já ali" e além disso, se estás mal a caminhar e se estás mal parada, o melhor é mesmo continuar.
Isto foi pouco e foi só um dia.
No próximo ano serão mais dias, mais km's e mais luta.